domingo, 29 de abril de 2012

O tempo.







O tempo.







O tempo viu,
Que não ia
Dar mais tempo.
Mas tempo,
Dá tempo...
Daria.

~César Augusto.


Foto: Henderson Baena

sábado, 21 de abril de 2012

Encanto

“Parti, coração, parti,

navegai sem vos deter,

ide-vos, minhas saudades

a meu amor socorrer” Gregório de Matos


Encanto.


Você que diz o amor

Diz não ser cura

Diz não ser sua

Toda vontade e dor

Diz não conhecer a flor

Que ontem foi oferecida

Diz não ser amante ou traída

Ou disso não ser remédio

Diz o amor, diz tédio

Mas não deixa minha ida.


Você que fala de surpresas

Mas foge dos convites

Diz não ser de bom alvitre

Diz injustas as terças

Diz vazias as mesas

Quando chamei o vinho

Foges das frases, dos mimos

Diz querer fechar os olhos

Mas nunca soltou fogos

Nunca aceitou meu carinho


Diz não ser amor isso

Diz não ser o desejo

Diz a rotina, diz o beijo

E nunca admitiu o vício

Sempre tratou como ilícito

Todo meu carinho de você

Ligações na quartas,

Todas as dedicadas cartas

E nunca deixou dizer pertinho

Nunca disse desquerer o versinho

Que escrevi sobre suas sardas.


~César Augusto.



Foto: Henderson Baena

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Desmentindo











Desmentindo











~I


Atualmente desmenti, metade das minhas mentiras


Nesses dias, desmistifiquei a magia de muitas coisas


Ando constantemente matando quem eram as pessoas


Que entronei sem sangue, sem luta, que não me queria



Só com letras. Só com sonhos. Percebi, que não sentia.


Descobri à pouco que muitas das coisas eram outras.


Que meus desejos eram outros, eram onde, eram forças


Para simplesmente continuar a dizer que mal-fazia.



Atualmente perquiri e tive solução, exato e desapaixonado.


Presenteei-me a verdade do vazio, a morte de muitos fatos


Que me tornavam amante sem leito, sem sentido



Rasguei aqueles meus versos heróicos e minha parnasiana


E todas as formas inverídicas com as quais falei da chama


Que não queimava, iluminava ou era abrigo



~II



No inverno da razão, amei sem passarinhos, sem flores,


Despetalei todo o mal-me-quer desse frio fantasma


Não fiz mais romances, sonetos, prosas ou cartas


Nem mesmo me peguei a desmerecer os reais amores.



Nesses dias de solidão, quando a faca causa sangue e dores.


Eu sofro, mas pelo metal, pelo fio, não por aquelas armas


Que me matavam infalível e rasgavam, sem garras


O que hoje tenho como meus platônicos rancores.



Desmenti metade das folhas e mais um pouco de mim,


Exorcizei todos os teus atributos das silabas e do nanquim


E sou mais feliz, mais real, menos cansado e cansativo.



Odes não me aprisionam, versos não enforcam,


As rimas não me sangram, as virgulas não me invocam


Estou mais para um pedaço disso, mas ainda vivo.



~III



E sem essas alegorias, sem esse silêncio, sem a covardia,


Sem viver daquelas entrelinhas, nos entremeios do abismo


Não tenho mais medo de morrer da inanição e do cinismo


De uma figura que sequer amava, respirava ou existia.



Era só silêncio, maçã de cera, ilusão que machucava e perfazia


Mais solidão, mais revolta e outros tantos litros


Do líquido da tristeza e da fome dos mais errados livros


Que me levavam a negar o pouco saber que me constituía.



Atualmente desmenti, essa saudade que andei criando.


Explodi todos os ídolos que andei amando.


Nesses dias, descobri as correntes nos teus pés.



Percebi o gesso nos teus joelhos


Apaguei todo o fogo dos teus cabelos


E caminhei por tua imagem através.



~César Augusto.



Foto: Henderson Baena

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Nessas Coisas.

Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo.” José Saramago.



Nessas Coisas.




Não sou muito bom nessas coisas,

Nessas assim: de contar tempo,

ou quandos, ou porquês.

Tudo vai e volta sem saber

Que horas fiquei sabendo.


Porque não sou bom nessas coisas,

Nessas assim: de escolher caminhos,

Ou retornos, ou vias alternativas

Tudo é acaso e destino na lasciva

Forma de padrão que não descobrimos.


Simplesmente por não ser bom nessas coisas.

Nessas assim: desapegos ou desamores,

Ou Desalentos, ou des-iludidos,

Tudo ama quando quer e até os indecisos

Decidem quando abstém-se dos tremores.


Ninguém é bom mesmo nessas coisas.

Nessas assim: de ser bom, de ser fato.

Ou de ser sólido, ou ser quem, ou de ser forma.

Tudo se escreve sozinho, psicografado

Por uma instância nascitura da veia aorta.


~César Augusto


Foto: Henderson Baena

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Há três anos





Há três anos








Há três anos, amarguei por fios rubros,

Dores e sorrisos que rezei afastar dos enredos

Como tanta maldade pode crescer nos cabelos

De quem alimentei sentimentos tão puros?


Há três anos, presenteei livros e frutos,

E morri à míngua de uma resposta aos apelos

Como pode tanta indiferença crescer nos seios

De quem tinha meu querer tão resoluto?


Há três anos, casei, simples e modesto,

E nunca mais alimentei virgulas ou manifesto

Até hoje, que rompi a fivela do cardo-isento


Para doer nesse cruel governo escarlate e tirano

Que outrora estancou o pingar rubro e humano

E hoje é simplesmente hemorragia sem remendo.


~


Há três anos, não provava do amargo suco

Que embriaga, lateja a arrepia os pelos

Há três anos: como pude não sofrê-los?

Como pude conter esse lancinante surto?


Já não sei. Há três anos, sem músculos,

Apanhei daquele cinismo, trotes, termos,

do silêncio e do descaso que estalavam os nervos

Há três anos, esse veneno, destilo e curto.


Essa poção que não revive e nem é gole funesto.

Mil e noventa e cinco pingos do que não é remédio

E não é só dor, só pesar ou só lamento.


Há três anos, sem morrer e sem ser insano

Sem ter onde, sem ter quem, ser ter quando

Descobri como dói a noção do tempo.


~César Augusto.


Foto: Henderson Baena

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Luz Carinhosa




Luz Carinhosa – à minha grande amiga Rachel Alvares





Sempre te senti diferente, alheia ao caos

Sempre percebi teu cuidado nos detalhes

De agradecer, de orar ou apontar um lápis

Teu poder de afastar os pensamentos maus...


Mesmo menina, sentia altivez e luz tal,

Que a todos ofuscava e ensurdecia a mensagem

Nos acordes, nos assopros, nas partituras e nas margens

Dessa mulher que hoje é encanto em maior grau,


Não é porque te vi menina, ou porque já não vejo

Que me esqueço dos teus sonhos, teus desejos

Serás sempre uma luz carinhosa neste peito cheio de letras,


Que tenhas em teu caminho o bem que espalha a todos

Porque o sorriso que tantas vezes inspirastes em meu rosto

É motivo pra ser feliz uma vida inteira.


~César Augusto

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Clarice fugia.




Clarice fugia.










Clarice fugia.

Sem sapatinho, não Se[nt]-ia.

Ela não ouvia, não dava ouvidos,

Não dava bola, não dava gritos,

Não dava nada, ela só ia.


Não acenava, nem dizia,

Clarice não queria, não Sa[b]-ia

Que nem tudo eram livros.

Ela odiava os mortos e os vivos

Ela só lia, nem So[rr]-ia.


Ela havia amado, ha-via.

Mas não deixava, não que[r]-ia.

Clarice não gestava seus filhos

Ela não paria seus mitos

Nada servia, ela So[f]-ria.


Clarice fugia.

Do amor, das apostas ela de-via.

Nem jogava, nem bebia, litros

Clarice só notava os riscos

Ela não vinha, nem par[t]-ia.


Ela era fria.

E se orgulhava, ela que[r]-ia

Parecer impermeável aos ritos

Clarice entediada em um circo

Sem risada, que não se[r]-via


Clarice fugia

De todos, de mim, Se-ria

Ela lamentava, e se dizia sem brilho

Uma estrangeira no exílio

Do cinismo que-ria.


Clarice me[nt]ia,

A altivez, a porfia,

A dureza de seus ditos

A descrença nos poemas lidos

Que Clarice rasgava e Mo[rr]ia.


Clarice, Ar...[d]ia...


~César Augusto.



Foto: Henderson Baena

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Hidra.

“Fere de leve a frase… E esquece… Nada Convém que se repita…
Só em linguagem amorosa agrada
A mesma coisa cem mil vezes dita.

Mario Quintana.




Hidra.


Nem fere, nem aranha a lira... e não esqueço...

Algo redunda, repete, recita...

Em um, dois, cem mil leitos

A mesma coisa negada, resgata e dita.

Nas sarjetas, nos poços e nos becos,

Serpenteia a palavra amorosa como hidra

Duzentas vezes morta, ainda grita.

E multiplica.

Quando cortamos-lhes a cabeça.


~César Augusto.



Foto: Henderson Baena